Desde 2009, todo ato de cunho sexual praticado com menor de 14 anos, mesmo com consentimento, é considerado crime de estupro de vulnerável. Levantamento do G1 junto às decisões dos Tribunais de Justiça de todo o país mostra que, mesmo após alterações do Código Penal, juízes e desembargadores continuam absolvendo réus.
A questão voltou a ser discutida depois que o STJ (Superior Tribunal de Justiça) absolveu um acusado de estupro de uma menina de 13 anos porque ela se prostituía. Para criminalistas, o entendimento estava correto porque o caso ocorreu antes da edição da nova lei do estupro. Se tivesse ocorrido depois, a absolvição já não mais se justificaria
Magistrados, no entanto, continuam aplicando o entendimento antigo aos casos novos.
Levantamento do G1 com 752 decisões de segunda instância disponíveis nos Tribunais de Justiça de todo o país (parte está em segredo de Justiça ou não foi publicada) mostra decisões que absolveram réus mesmo para casos ocorridos após a Lei 12.015/2009. Em primeira instância, esses processos correm em segredo de justiça.
Entenda a polêmica
A Lei 12.015/2009 criou no Código Penal a figura do ‘estupro de vulnerável’, tornando crime qualquer ato de cunho sexual com menores de 14, incluindo um simples beijo na boca. Pela lei, mesmo sem violência, as vítimas são consideradas, pela idade, desprotegidas, vulneráveis.
Antes, a discussão era sobre se houve violência no ato: uma corrente defendia a presunção relativa (a aparência, conhecimento, vida sexual anterior e o consentimento da vítima poderiam absolver o réu) e outra a absoluta (qualquer caso deveria levar à condenação, pela presumida violência).
“A nova lei inteligentemente fala em praticar ato sexual com vítima vulnerável. Ela pode ter capacidade de entender o que está fazendo, mas, mesmo sabendo, não importa”, afirma o procurador de Justiça licenciado Fernando Capez. “Não há o que se falar em presumir ou não violência, essa expressão ficou ultrapassada.”
Para Fábio Aguiar Munhoz Soares, juiz da 17ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, a lei atual é “exagerada” e não é impassível de interpretação. “Se fosse levar a lei ao pé da letra, teria que condenar e ponto final. Mas temos que pensar: para que serve o juiz? Ele é um mero aplicador da lei? Se pensarmos assim, estaremos desprezando a função de julgar”, afirma. “Toda vez que a lei fixa a situação de idade, cabe ao juiz dizer. Assim ajuda a fazer a lei.”
Aos 13 anos
A maioria das vítimas nos processos consultados pelo G1 tem 13 anos e sofreu o abuso dentro de casa, pelo pai ou padrasto, ou denunciou uma pessoa conhecida: um vizinho, o professor, o motorista do transporte escolar ou um amigo próximo da família.
O G1 encontrou 46 decisões para crimes ocorridos após a lei, contendo algum tipo de discussão sobre as alterações no Código Penal. São os primeiros processos que começam a chegar aos Tribunais de Justiça. Para que um caso seja julgado por um grupo de desembargadores, primeiro é preciso que o Ministério Público denuncie o acusado, que ele se torne réu, seja julgado por um juiz, que profere uma sentença para absolver ou condenar, e um recurso seja apresentado. O trâmite pode levar anos.
Do total de 46 acórdãos, 26 foram para condenar os réus e 15 foram para absolver. O restante se refere a medidas socioeducativas (a punição aplicada a menores). Na faixa entre os 12 e 13 anos, está a maior parte das absolvições que levam em conta o consentimento. Foram 14 condenações e 8 réus absolvidos porque a vítima consentiu a prática. Em quatro acórdãos, o acusado havia sido condenado em primeira instância.
Menino consentiu
Uma das decisões é de 20 de abril, em que foi vencedor o voto do desembargador Guilherme de Souza Nucci, do Tribunal de Justiça-SP, que absolveu um homem porque o menino de 13 anos consentiu os beijos e o sexo oral e afirmou gostar do réu. O acórdão (decisão tomada por um colegiado) não foi unânime. Leia mais sobre o caso
Em Mato Grosso do Sul, um escrivão de polícia foi absolvido porque o juiz entendeu que a menina de 13 anos consentiu a prática. E recebeu dinheiro pelo sexo: R$ 30 e R$ 50. No processo, ela afirmou não ser mais virgem. “Foram 5 pessoas [antes do réu].”
"De fato, forçoso concluir que procede o inconformismo da defesa", escreveu na decisão do dia 30 de janeiro de 2012, o juiz Francisco Gerardo de Sousa, relator. "Apesar da tenra idade, restou sobejamente demonstrado nos autos que a vítima não só consentiu os atos como também tinha a plena consciência deles.”
Namorados
Os desembargadores também criticam ter que condenar os acusados quando as próprias famílias os defendem. No Paraná, a mãe de uma menina de 12 anos denunciou o namorado da filha, de 29 anos, mas depois se arrependeu. “Um homem trabalhador, boa pessoa, sem vícios”, disse ao juiz. Já a menina afirmou que “teve relação sexual com seu namorado porque quis, sendo que foi ela quem convidou ele para tal coisa”.
“O novo sistema adotado pelo Código Penal para os crimes sexuais dificulta um tanto o uso desta válvula de escape para o bom senso", escreveu o relator, desembargador Miguel Pessoa, em decisão de 8 de março de 2012. "Em suma, na aplicação da nova lei, deve o julgador verificar com esmero se houve realmente um estupro ou apenas um inocente namoro.”
Para Pessoa, o juiz não pode “levar a lei ao pé da letra, e sim, ao interpretá-la, sentenciar buscando os verdadeiros interesses sociais, haja vista as profundas mudanças ocorridas no que toca a descoberta da sexualidade”.
Já quando os casos referem-se a dois menores de idade, os acórdãos mostram entendimentos ainda mais contraditórios. Em alguns, o Ministério Público recorre pedindo punição pelo ato infracional análogo a estupro, enquanto desembargadores pedem cautela. Em outros, ocorre o oposto.
No Rio Grande do Sul, o MP perdeu um recurso para punir um jovem de 16 anos e 2 meses por ter feito sexo com a namorada de 13 anos e 4 meses. Segundo uma testemunha, o casal “voltava abraçado do colégio”. Os desembargadores consideraram o fato de a menina ingerir anticoncepcionais e pedir camisinhas ao ex-namorado.
Em Santa Catarina, foi aplicada a medida socioeducativa contra um jovem menor de 18 anos porque engravidou uma menina de 13 anos, sua vizinha e colega de classe. Em primeira instância, o adolescente havia sido absolvido. “Basta que a vítima seja menor de 14 anos", escreveu em 8 de novembro de 2011 o relator, desembargador Alexandre D'Ivanenko. O adolescente deveria cumprir a prestação de serviços à comunidade por 6 meses, mas a punição prescreveu.
No Rio Grande do Norte, o desembargador relator, Virgílio Macedo Jr., tomou decisão contrária: "Não é prudente, nem mesmo razoável, que o juiz atenha-se somente às letras da lei, pois a valoração maior está na preponderância da justiça”. “Presumir de maneira absoluta a vulnerabilidade em fatos onde ela não existe, pode fazer surgir certas injustiças irreparáveis, como por exemplo, subtrair a liberdade de ir e vir de uma pessoa inocente.”
O caso era de um jovem de 20 anos, absolvido depois de ter sido condenado em primeira instância a uma pena de 8 anos de reclusão. Ele namorava uma menina de 13 anos e 9 meses. Segundo o processo, ele alegou que “cedeu à paixão e ao amor, pois suas intenções foram e são as melhores possíveis, inclusive com a intenção de casamento”.
Não é prudente, nem mesmo razoável, que o juiz atenha-se somente às letras da lei, pois a valoração maior está na preponderância da justiça"Virgílio Macedo Jr., desembargador do TJ do Rio Grande do NorteDiminuição da pena
O entendimento dos tribunais também reflete a discussão de criminalistas quando a lei entrou em vigor: uma lei penal mais severa, ou seja, que aumenta a pena para determinados crimes, não pode ser aplicada para casos anteriores. Mas se o réu recorrer pode ter a pena diminuída com base nessa legislação mais benéfica. O levantamento mostra que nenhuma decisão prejudicou os condenados.
Houve divergência, no entanto, entre os desembargadores em casos em que o estupro estava descrito como uma carícia por cima da roupa da vítima, uma tentativa que não chegou a ser finalizada com o ato sexual ou algo de brevíssima duração. Algumas decisões desclassificaram o crime de estupro para tentativa ou contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor, crimes menos graves. "É o direito do condenado", afirma Munhoz Soares.
Palavra da vítima
Ainda segundo o juiz de São Paulo, que trata diariamente desse tipo de processo, o depoimento das vítimas é avaliado como de relevância maior do que em qualquer outro. Isso porque o crime nem sempre deixa rastro e é cometido às escondidas. "Em regra, a palavra da vítima tem muita força sim”, afirma.
Em regra, a palavra da vítima tem muita força sim"Fábio Aguiar Munhoz Soares, juiz da 17ª Vara Criminal do TJ-SPAinda assim, o G1 encontrou mais de uma decisão em que o juiz ou desembargador não confiou no que dizia a vítima. Em Campinas, um juiz chega a ser advertido sobre o modo como teria interrogado uma menina de 11 anos, que acusava um homem de 64 de molestá-la. “(...) advertiu-a [a vítima] diversas vezes, além de utilizar termos chulos com a garota”, escreveu o relator, desembargador Silmar Fernandes.
O desembargador transcreveu parte das perguntas feitas pelo juiz: “Ele queria que você pusesse a boca no p... dele? ‘L: Não.’ (...) Ele chegou a por o p... pra fora da calça dele?” O réu estava em semiaberto, mesmo condenado a pena de 8 anos, quando a regra é o inicial fechado. O nome do juiz não aparece na decisão.
Em Piracicaba (SP), o juiz Wander Pereira Rossette Júnior absolveu um réu do estupro de um menino com 9 anos de idade, portador de deficiência física e mental, que a mãe disse ter presenciado. “Não iria acusar um inocente sem mais nem menos”, escreveu o relator do recurso, Luiz Soares de Mello, para reformar a sentença e condenar o agressor a 8 anos de reclusão em regime fechado. Procurado pelo G1, o juiz informou que não se pronunciaria sobre casos em andamento.
A questão voltou a ser discutida depois que o STJ (Superior Tribunal de Justiça) absolveu um acusado de estupro de uma menina de 13 anos porque ela se prostituía. Para criminalistas, o entendimento estava correto porque o caso ocorreu antes da edição da nova lei do estupro. Se tivesse ocorrido depois, a absolvição já não mais se justificaria
Magistrados, no entanto, continuam aplicando o entendimento antigo aos casos novos.
Levantamento do G1 com 752 decisões de segunda instância disponíveis nos Tribunais de Justiça de todo o país (parte está em segredo de Justiça ou não foi publicada) mostra decisões que absolveram réus mesmo para casos ocorridos após a Lei 12.015/2009. Em primeira instância, esses processos correm em segredo de justiça.
ro de vulnerável no Código Penal, segundo o procurador da República Luiz Carlos Gonçalves, relator do anteprojeto de reforma no Senado. “Estamos concordando em parte com essa crítica e reduzindo a idade de consentimento para 12 anos”, afirmou ele ao G1.
Entenda a polêmica
A Lei 12.015/2009 criou no Código Penal a figura do ‘estupro de vulnerável’, tornando crime qualquer ato de cunho sexual com menores de 14, incluindo um simples beijo na boca. Pela lei, mesmo sem violência, as vítimas são consideradas, pela idade, desprotegidas, vulneráveis.
Antes, a discussão era sobre se houve violência no ato: uma corrente defendia a presunção relativa (a aparência, conhecimento, vida sexual anterior e o consentimento da vítima poderiam absolver o réu) e outra a absoluta (qualquer caso deveria levar à condenação, pela presumida violência).
“A nova lei inteligentemente fala em praticar ato sexual com vítima vulnerável. Ela pode ter capacidade de entender o que está fazendo, mas, mesmo sabendo, não importa”, afirma o procurador de Justiça licenciado Fernando Capez. “Não há o que se falar em presumir ou não violência, essa expressão ficou ultrapassada.”
Para Fábio Aguiar Munhoz Soares, juiz da 17ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, a lei atual é “exagerada” e não é impassível de interpretação. “Se fosse levar a lei ao pé da letra, teria que condenar e ponto final. Mas temos que pensar: para que serve o juiz? Ele é um mero aplicador da lei? Se pensarmos assim, estaremos desprezando a função de julgar”, afirma. “Toda vez que a lei fixa a situação de idade, cabe ao juiz dizer. Assim ajuda a fazer a lei.”
Aos 13 anos
A maioria das vítimas nos processos consultados pelo G1 tem 13 anos e sofreu o abuso dentro de casa, pelo pai ou padrasto, ou denunciou uma pessoa conhecida: um vizinho, o professor, o motorista do transporte escolar ou um amigo próximo da família.
O G1 encontrou 46 decisões para crimes ocorridos após a lei, contendo algum tipo de discussão sobre as alterações no Código Penal. São os primeiros processos que começam a chegar aos Tribunais de Justiça. Para que um caso seja julgado por um grupo de desembargadores, primeiro é preciso que o Ministério Público denuncie o acusado, que ele se torne réu, seja julgado por um juiz, que profere uma sentença para absolver ou condenar, e um recurso seja apresentado. O trâmite pode levar anos.
Do total de 46 acórdãos, 26 foram para condenar os réus e 15 foram para absolver. O restante se refere a medidas socioeducativas (a punição aplicada a menores). Na faixa entre os 12 e 13 anos, está a maior parte das absolvições que levam em conta o consentimento. Foram 14 condenações e 8 réus absolvidos porque a vítima consentiu a prática. Em quatro acórdãos, o acusado havia sido condenado em primeira instância.
Menino consentiu
Uma das decisões é de 20 de abril, em que foi vencedor o voto do desembargador Guilherme de Souza Nucci, do Tribunal de Justiça-SP, que absolveu um homem porque o menino de 13 anos consentiu os beijos e o sexo oral e afirmou gostar do réu. O acórdão (decisão tomada por um colegiado) não foi unânime. Leia mais sobre o caso
Em Mato Grosso do Sul, um escrivão de polícia foi absolvido porque o juiz entendeu que a menina de 13 anos consentiu a prática. E recebeu dinheiro pelo sexo: R$ 30 e R$ 50. No processo, ela afirmou não ser mais virgem. “Foram 5 pessoas [antes do réu].”
"De fato, forçoso concluir que procede o inconformismo da defesa", escreveu na decisão do dia 30 de janeiro de 2012, o juiz Francisco Gerardo de Sousa, relator. "Apesar da tenra idade, restou sobejamente demonstrado nos autos que a vítima não só consentiu os atos como também tinha a plena consciência deles.”
Namorados
Os desembargadores também criticam ter que condenar os acusados quando as próprias famílias os defendem. No Paraná, a mãe de uma menina de 12 anos denunciou o namorado da filha, de 29 anos, mas depois se arrependeu. “Um homem trabalhador, boa pessoa, sem vícios”, disse ao juiz. Já a menina afirmou que “teve relação sexual com seu namorado porque quis, sendo que foi ela quem convidou ele para tal coisa”.
“O novo sistema adotado pelo Código Penal para os crimes sexuais dificulta um tanto o uso desta válvula de escape para o bom senso", escreveu o relator, desembargador Miguel Pessoa, em decisão de 8 de março de 2012. "Em suma, na aplicação da nova lei, deve o julgador verificar com esmero se houve realmente um estupro ou apenas um inocente namoro.”
Para Pessoa, o juiz não pode “levar a lei ao pé da letra, e sim, ao interpretá-la, sentenciar buscando os verdadeiros interesses sociais, haja vista as profundas mudanças ocorridas no que toca a descoberta da sexualidade”.
Já quando os casos referem-se a dois menores de idade, os acórdãos mostram entendimentos ainda mais contraditórios. Em alguns, o Ministério Público recorre pedindo punição pelo ato infracional análogo a estupro, enquanto desembargadores pedem cautela. Em outros, ocorre o oposto.
No Rio Grande do Sul, o MP perdeu um recurso para punir um jovem de 16 anos e 2 meses por ter feito sexo com a namorada de 13 anos e 4 meses. Segundo uma testemunha, o casal “voltava abraçado do colégio”. Os desembargadores consideraram o fato de a menina ingerir anticoncepcionais e pedir camisinhas ao ex-namorado.
Em Santa Catarina, foi aplicada a medida socioeducativa contra um jovem menor de 18 anos porque engravidou uma menina de 13 anos, sua vizinha e colega de classe. Em primeira instância, o adolescente havia sido absolvido. “Basta que a vítima seja menor de 14 anos", escreveu em 8 de novembro de 2011 o relator, desembargador Alexandre D'Ivanenko. O adolescente deveria cumprir a prestação de serviços à comunidade por 6 meses, mas a punição prescreveu.
No Rio Grande do Norte, o desembargador relator, Virgílio Macedo Jr., tomou decisão contrária: "Não é prudente, nem mesmo razoável, que o juiz atenha-se somente às letras da lei, pois a valoração maior está na preponderância da justiça”. “Presumir de maneira absoluta a vulnerabilidade em fatos onde ela não existe, pode fazer surgir certas injustiças irreparáveis, como por exemplo, subtrair a liberdade de ir e vir de uma pessoa inocente.”
O caso era de um jovem de 20 anos, absolvido depois de ter sido condenado em primeira instância a uma pena de 8 anos de reclusão. Ele namorava uma menina de 13 anos e 9 meses. Segundo o processo, ele alegou que “cedeu à paixão e ao amor, pois suas intenções foram e são as melhores possíveis, inclusive com a intenção de casamento”.
Não é prudente, nem mesmo razoável, que o juiz atenha-se somente às letras da lei, pois a valoração maior está na preponderância da justiça"Virgílio Macedo Jr., desembargador do TJ do Rio Grande do NorteDiminuição da pena
O entendimento dos tribunais também reflete a discussão de criminalistas quando a lei entrou em vigor: uma lei penal mais severa, ou seja, que aumenta a pena para determinados crimes, não pode ser aplicada para casos anteriores. Mas se o réu recorrer pode ter a pena diminuída com base nessa legislação mais benéfica. O levantamento mostra que nenhuma decisão prejudicou os condenados.
Houve divergência, no entanto, entre os desembargadores em casos em que o estupro estava descrito como uma carícia por cima da roupa da vítima, uma tentativa que não chegou a ser finalizada com o ato sexual ou algo de brevíssima duração. Algumas decisões desclassificaram o crime de estupro para tentativa ou contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor, crimes menos graves. "É o direito do condenado", afirma Munhoz Soares.
Palavra da vítima
Ainda segundo o juiz de São Paulo, que trata diariamente desse tipo de processo, o depoimento das vítimas é avaliado como de relevância maior do que em qualquer outro. Isso porque o crime nem sempre deixa rastro e é cometido às escondidas. "Em regra, a palavra da vítima tem muita força sim”, afirma.
Em regra, a palavra da vítima tem muita força sim"Fábio Aguiar Munhoz Soares, juiz da 17ª Vara Criminal do TJ-SPAinda assim, o G1 encontrou mais de uma decisão em que o juiz ou desembargador não confiou no que dizia a vítima. Em Campinas, um juiz chega a ser advertido sobre o modo como teria interrogado uma menina de 11 anos, que acusava um homem de 64 de molestá-la. “(...) advertiu-a [a vítima] diversas vezes, além de utilizar termos chulos com a garota”, escreveu o relator, desembargador Silmar Fernandes.
O desembargador transcreveu parte das perguntas feitas pelo juiz: “Ele queria que você pusesse a boca no p... dele? ‘L: Não.’ (...) Ele chegou a por o p... pra fora da calça dele?” O réu estava em semiaberto, mesmo condenado a pena de 8 anos, quando a regra é o inicial fechado. O nome do juiz não aparece na decisão.
Em Piracicaba (SP), o juiz Wander Pereira Rossette Júnior absolveu um réu do estupro de um menino com 9 anos de idade, portador de deficiência física e mental, que a mãe disse ter presenciado. “Não iria acusar um inocente sem mais nem menos”, escreveu o relator do recurso, Luiz Soares de Mello, para reformar a sentença e condenar o agressor a 8 anos de reclusão em regime fechado. Procurado pelo G1, o juiz informou que não se pronunciaria sobre casos em andamento.
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